terça-feira, junho 20, 2006

"X"

O “X” não era mais que um esconderijo numa pequena encosta da avenida paralela à minha rua. Tinha uns arbustos e no cimo da encosta havia uma vedação a separá-la dos quintais que haviam por detrás dos prédios e um dia, quando passávamos a pé pela avenida, para colher azedas, demos conta de que aquele seria o “espaço” ideal para as meninas se reunirem. Foi então que eu, a Liliana e a Patrícia, decidimos baptizar o local com o invulgar nome de X.

Aquele lugar era perigoso. Ficava próximo da avenida, os quintais estavam desertos ao fim de semana e se nos acontecesse alguma coisa, nem com gritos nos ouviam. Mas era o nosso esconderijo. Não dava para jogar à apanhada. Não dava para as escondidas porque a encosta era bastante íngreme, não dava mesmo para nada. Era mesmo só para o “stick around” ou o “hang out”. Não se falava sobre nada. Era mesmo só porque era o nosso esconderijo. E fazer disso segredo era o máximo. Uma das vezes, na maioria delas ao Sábado, estava eu e a Liliana a colher azedas quando a maluca da Patrícia resolve trepar a encosta para ver se conseguia entrar nos quintais. Nem 5 minutos passaram quando a Patrícia sobrevoou literalmente as nossas cabeças e estatelou-se na avenida. Partiu-se toda. Tinha visto uma cobra. Uma cobra muito grande. A Liliana foi ver. Não era uma cobra. Era uma peúga velha. Ainda hoje, se nos virmos, gozamos com ela por causa da peúga.

Entretanto fiz 10 anos. Elas eram um ano mais velhas que eu. Começaram a jogar ao bate-pé. E nada melhor do que jogar no “X”. Assim ninguém iria contar aos pais. Os putos ranhosos começaram a frequentar o dito local. Honestamente, odiava o jogo. E acabaram por gozar comigo por isso. Costumavam dizer: se disseres a palavra “linguado” ao pé da Camélia, dá-lhe 1 minuto e nunca mais a vês!!!

Era verdade. Deve ter sido fruto da má experiência que tive da primeira vez que joguei. Só conseguia associar aquela boca a uma lula gigante, uma ventosa ou um desentupidor de lavatórios. Juro. E aquilo parecia-me tão medonho que eu dizia sempre: a minha mãe está a chamar-me. E zumba!!! Pirava-me dali. É que nem olhava para trás. Os anos passaram, e se jogasse ao bate-pé, levava só com o beijo na cara ou um aperto de mão. Foi nesta altura que descobri as maravilhas do skate. E que andava sempre de fato de treino e ténis de marca. Parecia um puto (depois com 15 anos parecia uma matrona de 30, com os chumaços, a popa, as mini-saias de veludo/pele de pêssego e as camisolas angorá estampadas. Agora, com 30 pareço uma pita de 15, mas isso agora não interessa nada, antes pita que matrona).

Entretanto, o “X” deixou de ter aquela magia de esconderijo de miúdas. Já toda a gente conhecia aquilo. Acho que passei a ir lá uma vez por mês. Depois nem isso. Estavam sempre casais por lá. Nos dias de hoje, tinha feito daquilo um negócio: Camélia’s Rendez-Vous ou “Batam o pé aqui”, este último mais adequado à freguesia. Nem as obras para a Expo destruíram o “X”. Sempre que vou aos meus pais, dou uma espreitadela, mas sempre dentro do meu carro, pois se na altura aquilo já era perigoso, nos dias de hoje então...ainda me saltava de lá uma peúga turca!! Medo!

4 comentários:

Mónica Lice disse...

Pequenas grandes cumplicidades, que estão sempre presentes!:)

Folha de Chá disse...

Um peúga atrás de uma capa voadora? eh eh eh eh :) :) :)

Mas entendo-te perfeitamente. Nunca tive pachorra para esses jogos de baté-pés e companhia limitada. Vão lá dar beijos ao cão, que a mim só me beija quem eu quero. :) :) :) :)

Camélia disse...

LOOOOOOOOOOOOL, oh Folha só tu p/me fazeres rir a esta hora do dia. E mai nada ;)

Magnolia disse...

Pior, pior, era se a meia - além de turca - tivesse raquete...

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